a luta

26/01/2016

a primeira vez em que meu nome saiu no jornal, como cantora, foi em 1983, mais de 30 anos atrás. mas considero o começo oficial da minha carreira, dedicida, escolhida, no ano de 1987. Foi lá que decidi que aquela apresentação que eu já fazia havia anos, a partir daquele momento, passaria a ser um show. mudou a perspectiva, tamos aí. não é fácil, em verdade vos digo, não é fácil. aqui comigo mesma tenho mil contas pra fechar, todas bem pessoais e que, certamente, não se resumem a aparecer na TV ou tocar na novela. muito, muito além…

não gosto de reclamar,  mas tenho reclamado, nao sei se é da idade ou se as coisas estão péssimas, mesmo. mas me esforço pra não reclamar, nem pra fora, nem pra dentro. tento, como me sugeriu minha irmã, focar no que tenho e não no que não tenho. e quando vejo um artista se referindo ao seu trabalho como uma  luta, me pergunto se essa não é a deixa pro cara mudar de ramo. se aquilo que se faz por dom, necessidade e prazer vira uma luta, um drama, um sofrimento com o qual se precisa conviver, sentindo dor, nao seria a hora de parar? quanta tristeza e desilusão são necessárias pra um artista decidir parar? por que é tão difícil desistir do que está ruim? o artista é quase sempre como o amante que vive na esperança de seu amor, enfim, dar-lhe o devido valor.

balanço

31/12/2015

a coisa que uma cantora mais deseja é conseguir continuar cantando, apesar do mundo. não canto pra agradar ninguém, não canto pra ficar rica ou famosa, não canto pra causar, não canto pra ser diva ou pra ser idolatrada. eu canto pra cantar. porque sinto que dentro de mim tem uma fonte de onde brota uma energia ininterrupta, e cantar é como um chafariz, que projeta pra fora de mim o que nasce lá dentro, numa lógica caótica, que mistura sons e palavras e sensações. o negócio jorra, e aí é preciso cantar. só a música pode carregar essa corrente pra fora de mim. é simbiose, eu vivo dentro dela e ela vive dentro de mim. terror e êxtase. 
 
tenho uma lista interminável de desejos e projetos profissionais, tenho muitas lindas ideias, tenho discos pra gravar, shows pra fazer, lugares pra visitar cantando e velhos sonhos amarrotados no fundo da memória. sempre será necessário um convite, parcerias, dinheiro, patrocínio, ajuda, reconhecimento e oportunidades. ninguém faz nada sozinho e sem grana. não tenho padrinhos, não tenho parentes famosos, não tenho dinheiro. nunca, em 29 anos de carreira, um jornalista de música foi me ver cantar. e eu cantei sem parar nesse tempo, sem descanso. gravei cinco discos solo e cinco discos e um DVD com o Arranco. gravei e fiz shows com um monte de gente famosa, cantei acompanhada dos melhores músicos deste país, nas melhores casas dentro e até fora do país. mas em 2015, todas as portas se fecharam pra mim e nao consegui realizar quase nada. eu resisti, porque eu sempre resisto, porque sem cantar eu nao sou. estou previamente combinada comigo mesma que fazer música não pode estar vinculado à sordidez desse mercado excludente e dessa cena musical pífia.
 
por mais bobo que seja, a gente não escapa! fim de ano chega e a gente bota as coisas na balança pra fazer os ajustes da caminhada. das poucas coisas que 2015 me deu, a melhor foi continuar trabalhando na casa de música mais profissional desta cidade, acompanhada pelos meus fieis escudeiros de ouro, cantando para minha plateia atenta, sensível, apaixonada por música. quando a gente perde quase tudo, a gente aprende a valorizar o que tem. e por isso contei essa história toda, pra dizer que os elos dessa corrente se fortalecem com vocês, com seu aplauso e sua presença. por isso sempre serei grata por vocês me darem a honra de cantar para vocês. obrigada. 
que seu novo ano seja leve, de alegrias e paz e cheio de saúde, prosperidade e amor!
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love songs

27/07/2013

amigos, café, chocolate, vinho do porto, fumo. a música é variada. coisas que a gente nunca mais cantou, e cujas letras emergem dos subterrâneos da memória, trazendo junto avalanches de lembranças e cheiros e cores de outras vidas. e os amores. penso nas paixões que vivi, no fracasso da minha vida amorosa, nas péssimas escolhas que fiz, nas incontáveis frustrações. volta a velha e permanente sensação de que o meu pacote de serviços não inclui amar e ser amada. embora esteja acostumada, tenho me sentido só. quem, nunca? deve ser o inverno. ou a idade. ou o vento. passa. canto canções de amor e, por dentro, me sinto uma impostora. as canções de amor quase perderam o sentido pra mim, é como se eu cantasse sobre um unicórnio, sobre uma fada, um dragão, ou atlântida. ausência ilustre, lâmpada queimada, terreno baldio, corda quebrada de violão. amor: meu continente perdido.

autoajuda

15/09/2012

gosto mesmo qdo falam: “seu sucesso só depende de vc!” E aí a gente fica andando pela vida, carregando aquela culpa master, por ser um incompetente absoluto, por não saber encontrar o sucesso, por não saber galgar os degraus da fama e por não chegar nunca “lá”. Embora trabalhe com as forças do mundo real, com afinco, tendo resultados humanos. Esse resultado mágico, só no imaginário de quem tem a imagem distorcida da realidade. Realidade dói e tem momentos de prazer e fúria. Desconheço esse Olimpo dos deslumbrados com a magia, que promete a mais fácil das saídas: pense e obterá tudo o que desejar. Desejar é fácil, quero ver meter a mão na massa real.

Tenho uma vergonha alheia terrível qdo as madames enchem a boca pra falar de física quântica, uma matéria super específica e escabrosa, para cabeças altamente treinadas. Elas leram as leis do sucesso de Depak e se sentem, assim, as cientistas da autoajuda. Citam física como quem cita a profundidade de Paulo Coelho: boca cheia, cabeça vazia. E os físicos, tadinhos, fora aqueles que trabalharam para o pessoal d’O Segredo e do Quem somos nós, o que será que eles têm a dizer sobre a física aplicada ao eso(his)terismo de madame?

Eu faço música de autoajuda. Meu procedimento quântico é no palco, cantando, desopilando da vida bandida e movimentando nanoesferas de energia boa, oferecendo beleza para quem escuta, diversão pra quem precisa e alívio para as dores do mundo, especialmente as minhas. Essa circulação é pura física, é pura química, é pura biologia. “Lá” pra mim, é o palco. Lá eu chego bem relax.

sinal fechado

30/05/2012

tem dias em que não vai ser possível olhar nos olhos, nem abraçar, nem falar da vida. apenas manter tudo bem na superfície, falar de amenidades, ver novela, falar mal de um novo cantor, ver um filme sem prestar atenção. se embriagar, embora perigoso, é excelente nesses dias, a gente bebe de se perder e depois dança, dança, dança como se não houvesse amanhã. e na verdade não há. nesses dias, não pergunte se tá td bem e nem qual é a boa, pq o que tem é uma vontade desesperada de chorar. e um medo de arrepiar.

e tu? não quer?

01/05/2009

quando eu entrei no taxi , o motorista ligou o rádio e disse:

– tem um monte de cantora boa aí, sendo lançada…

– eu sou uma cantora boa, mas não estou sendo lançada – falei.

– é? não está sendo lançada por quê? não quer?

– é que eu tenho 20 anos de carreira, já tô mais que lançada.

– ah, é? e tu já foi no faustão?

– não, nunca fui.

– e vai dizer que tu não quer ir no faustão?

– não é isso. É que nem todo mundo tem a ver com o faustão. É possível ter uma carreira sem passar pelo faustão, sabe?

– mas vai dizer que tu prefere ficar assim, completamente desconhecida, em vez de ir no faustão? claro que tu quer ir no faustão, pô, o brasil inteiro quer ir no faustão, todo mundo te olhando, tu com aquele padrinhão… tu tem que arrumar um empresário, pra isso que serve empresário.  Se tu ganha, ele vai junto. Aí é que ele trabalha pra tu…