vida, minha vida

12/09/2018

Quantos rostos sorridentes, desconhecidos sorrindo pra mim? quilômetros de milhares de bocas sorrindo, de olhos abertos pra mim, de silêncios. Anos e anos pessoas fazendo silêncio pra mim. Olhando pro som que vem de mim, ouvindo o que trago, boas novas e boas velhas, sempre boas, as canções. Quantos camarins, bons e ruins, luz funcionando, luz quebrada. Cadeira boa, cadeira dura, cadeira bamba. Ar condicionado frio demais, calor demais. E quantos espelhos, quantos banheiros pra maquiar de qualquer jeito, pra molhar a barra da calça ao trocar figurinos. Quantos figurinos? Quantos batons? Quantas vans? ônibus e carros e taxis. Palcos então… todos os tipos. Altos, baixos, praticáveis, impraticáveis, carros de som. Palco de andaime, medo de despencar lá de cima, no meio da praça do coreto da cidade pequena. Cidades pequenas, cidades grandes, hotéis. Micro palcos, com o arco do contrabaixo levantando a barra da saia, ou um canto de sala, um cantinho qualquer. Microfones, quantas vezes disse testetesteteste. Retorno, agudo, médio, grave, reverb. Quantos sons passei, quanta luz? Forte demais, escuro demais, verde demais. Médios, então, quantas médias altas pra tirar. E boas noites, sejam bem vindos, espero que gostem, essa música foi, a próxima vai ser, queria agradecer. No palco comigo esta noite, fulanos sicranos beltranos; Quantos músicos e instrumentos e solos e intros e finais. Muitas palmas e uhús. Milhares de palmas e uhus. Milhões de palmas e uhús. Muito obrigada, voltem sempre, tragam os amigos.
Palco do Chiswick town Hall, em Londres, onde dancei balé clássico quando tinha 12 anos. 

o piano

21/09/2015

Tinha piano na casa dos meus dois avós. desde pequena eu me trancava na sala onde ficava o piano e mandava ver. tocava aleatoriamente, em momentos de fantasia e entrega, como se soubesse tocar. tentei estudar sozinha por um método, e poderia ter começado ali, mas nao tive incentivo. pedi pra estudar piano mas, a minha mãe, traumatizada por ter sido obrigada a se formar no conservatório, não deixou. então, dei meu jeito. peguei um violão que tinha sido da minha irmã, e venci o coitado pelo cansaço. tinha eu 14 anos de idade…

insisti, aprendi umas músicas da moda, fiquei feliz, fiz umas canções, mostrei pros amigos, entrei em festivais, ganhei e perdi e, quando vi, aquilo tinha virado a minha vida. quando fiz 16 anos, minha mãe me deu um violão de verdade. mas nunca soube tocar direito, embora tenha começado assim, tocando violão e cantando em bares, nos intervalos de outros artistas, até achar meu próprio lugar.

anos depois, já cantora e adulta, fui estudar piano e me dediquei totalmente a recuperar o tempo perdido. estudei muuuito, muito, mesmo. anos e anos praticando loucamente. hoje, o piano que tenho em casa é o que meu avô mandou vir pra minha mãe estudar nele. e, assim, fizemos as pazes com o destino do piano, com a música na família e com meu sonho. nunca toquei como gostaria de ter tocado, mas isso não importa. ser cantora é um encanto que nunca se esgota.