A minha Modern Sound

14/12/2010

Cantei durante cinco anos na Modern Sound, todos os sábados, fiz exatamente 265 shows na casa. Em 2001 inaugurei o horário da tarde, de 16h às 20h,  com a Délia Fischer e o Zé Luiz Maia, ainda sem bateria, pra ver se funcionava.  Fui a primeira e única cantora fixa da casa, que só tinha instrumental nos outros dias. No começo não ia ninguém. Seis meses depois ganhamos o direito à bateria. Entrou o Kleberson Caetano.Vi o lugar pegar, devagar, e chegar a ter 200 pessoas, sábado após sábado, bombando! Dois anos depois, a Delia saiu, entrou o Paulo Malaguti Pauleira. O Kleberson saiu, entrou o Cacá Colon. O Zé ficou impedido de continuar, entrou o Mattosão. Hoje tenho dois baixistas, um luxo!

Eu que sempre ouvi de tudo, sempre me apaixonei por estilos e praias diversas, tive uma oportunidade que raramente é dada a uma cantora: residência, formação de público, teste de repertório, numa casa excelente. O que era pra ser música ambiente virou show. O repertório foi crescendo pra todos os lados: muitos standards de jazz, mpb, samba, Tom Jobim, Cole Porter, Cartola, Toninho Horta, Joyce, Thelonious Monk, Carole King, James Taylor, Stevie Wonder, Chico Buarque, tudo o que se pode imaginar. Tocamos a seleção de Bossa Nova do Ruy Castro, que disse que quando morresse, em vez de ir pro céu, queria ir pra M.S. Tomamos muitas caipirinhas, comemos muito salmão com alcaparras, muito carpaccio, muita cerveja gelada, até fumar podia.

Amadureci como artista, experimentei emissões, respirações, projeções, timbres, ganhei intimidade com o fazer música sob qq intempérie. Deprimida, feliz, doente, cansada, maravilhosa, de saco cheio, apaixonada, sempre lá. Fiquei 5 anos sem sair à noite na sexta, pra ficar pronta pro sabado. Recebemos canjas de tts músicos maravilhosos, que eu nem saberia mais enumerar, mas lembro do Mike Shapiro, do Idriss Boudrioua que ficava pra tocar You don’t  know what love is, do Carlos Balla, do Itamar Assiere, do Alex Rocha, do Bruno Migliari, do Marcelo Costa, da Leny Andrade, do Marcelo Mariano, do Henrique Band, do Glaucus Linx, e muitos mais que fariam essa lista ficar imensa e estrelada.

Tinha gente que ia toda semana, anos e anos a fio. Isso sem falar nos amigos que fizeram da Modern um ponto de encontro. Todo sábado eu recebia visitas deliciosas, que viravam noitadas intermináveis depois que a casa fechava. Vi minha sobrinha crescer ali, correndo entre as mesas e os discos. Fizemos casamentos, uma amiga saiu de lá pra maternidade, tivemos amores, desamores, amantes, desamantes, tudo aconteceu!

Serei eternamente grata à Modern Sound e a tudo o que vivi naqueles felizes 5 anos, que de certa forma perduram até hoje, no patrimônio profissional mais valioso que construí na minha vida, o agora Andrea Dutra Quarteto, que em 2011  faz 10 anos de atividades, com a bola lá no alto, agora residente mensal no especialissimo Triboz, onde continuamos a nossa saga de tocar música bonita, seja ela qual for. Eu, Pauleira, Mattoso e o Cassius Theperson, que assumiu a bateria no ano passado.. Todo primeiro sábado do mês.

Qual não foi a minha surpresa quando cheguei pra cantar no Triboz e vi aquelas carinhas do tempo da Modern, na platéia, ainda fiéis. Muita emoção, muita felicidade.

O show sempre vai continuar, mas agora, quando o fechamento da Modern Sound é fato a ser consumado no dia 31, não pude deixar de me emocionar com o filme da minha vida, que passou dentro de mim, com a melhor trilha sonora que alguém já concebeu. Music in me.

nós iremos até Paris, arrasar no Olympia, o show tem que continuar

Zé, eu, Kleberson e Pauleira, o Quarteto Moderno, nascido e criado na Modern Sound. Foto de Simone Portellada

27 Respostas to “A minha Modern Sound”

  1. Thaís said

    é querida… torcendo muito por uma reviravolta de última hora. 😦

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  2. Luanda Cozetti said

    fez um buraquinho no meu coração tchuca…a modern era a minnha meca qd eu ia pro rio de férias,ainda morando em brasília…juntava grana pra comprar discos e passava horas lá dentro…hooras,nenhuma perdida,tava era me “encontrando”…saudades de vc. bateu!
    sua lulu!

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  3. Agora até chorei, amiguinha….

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  4. thaís, acho que isso nao rola…

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  5. opa! quem escreveu isso? do meu email? caraaaca, será que fui eu mesma, em outra dimensao?

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  6. luluuu, tem lugares, coisas, pessoas que parecem que nunca vao acabar, né? E nao deviam, mesmo… Mas nosso amor nao acaba, nao, isso eu sei!

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  7. quem, queeeem escreveu esse comentário?

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  8. Marfiza said

    Quando eu morava em Copa, a Modern era quintal da minha casa… Apesar de estar numa fase workaholic naquela fase… eu ia com certa frequência… Foi onde te vi cantar pela primeira vez cara mia! Vc estava cantando “Sister”… e eu adorei…
    Como não bebo, muitas vezes pedia bolo de laranja acompanhado por chá, rs. Algumas vezes comia o famoso salmão com alcaparras que vc. citou… São esses os sons e sabores que fazem parte das minhas memórias da Modern com vc. Estive lá em muitas outras ocasões e vi shows maravilhoso de outros grandes artistas… Foi lá que conheci (Simone Portelada (através de vc), conheci Pedrinho, reencontrei o Beto, (vendedor e músico) com quem eu havia tocado anos antes… levei o povo da You, a Bahiana Fernanda Noronha, o pianista Bob Lyle, os produtores Duke Jones, Jacques Burvick e Norman Connors, pra mostrar a casa e nossa boa música… enfim, são muitos recuerdos que só me ocorreram agora, lendo seu post. Super valeu! Vida longa ao AD Quartet.

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  9. marf, é isso aí, querida, todas nós fizemos a história daquele lugar, que tb fez parte da nossa. Sorte a nossa, né? Um cenário desses!! beijao!

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  10. Uma tragédia essa perda anunciada. Ainda não caiu a ficha. A Modern sempre foi a minha loja de discos favorita. Quantas raridades achei lá. Depois passou também a ser referência de música ao vivo. Foi lá que te vi, Andréa, cantando pela primeira vez! Era época de carnaval, você com o Arranco. Que saudade! Sempre que vou de férias ao Rio, passo lá boa parte do meu tempo. É tanta coisa boa que daria para ir todos os dias. Não sei o que está acontecendo no Rio. Toda hora leio notícias de espaços fechando. Espero que outros estejam abrindo no mesmo ritmo. Mas sem a Modern, o Rio nunca mais será o mesmo. Triste.
    Bjs

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  11. carlucho said

    É mais uma casa importante que acaba no Rio.Espaço nobre,pois amante da música de qualidade. Ali,pude ver ótimos shows.Só de Andréa Dutra e do Arranco Varsoviano vi infinitos,pois eles prosseguirão aonde houver música pra valer.
    Carluchiando.blogspot.com

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  12. Alan, sempre penso que se a virgin records de times square fechou, pq a modern nao fecharia? só se reinventasse sua atividade, coisa que nao rolou, né? o Rio está acabado nesse ponto, Alan, e o músico caminha pra franca desprofissionalização, infelizmente. bjk

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  13. carlucho, e vc sabe muito bem disso, amigo, vamos em frente, mesmo! beijao

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  14. madoka said

    que história linda Andrea, sem nunca estar na Modern imaginei vc e toda a atmosfera por ti descrita neste post. Você é pura emoção escrevendo, imagine quem já te viu cantando ao vivo, putz querida um dia ainda vou te aplaudir ao vivo.
    um abraço carinhoso

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  15. Alvaro said

    Fiquei muito, muito trite com a noticia. Tenho, como muitos, uma relação afetiva com a Modern Sound: era a loja onde, nos tempos de ditadura da minha adolescência, dava pra comprar discos imoportados “subversivos”: Victor Jara, Violeta Parra, Mercedes Sosa, Patricio Mans… E isso pra não falar do cheiro de vinil que a loja tinha naquela época, e ainda do cinema que ficava no final da galeria, pra onde eu fugia nas tardes de meio de semana…
    Agora só falta virem me dizer que a Leonardo da Vinci vai fechar.
    RIP, Modern Sound. E sempre na minha memória.

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  16. madoka, querida, aproveito pra te dar um beijo e agradecer por toda a sua gentileza e generosidade comigo e desejar que 2011 seja um super ano maravilhoso pra vc e sua tribo. Já te falei pra me levar pra cantar aí no Jpão, vou amarradona!!! E vc nunca vem aqui na terrinha? beijao, tudo de bom

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  17. Álvaro, o Rio nao tem tradição de preservar sua memória. Em Paris vc ainda bebe e come ostras no mesmo lugar que Victor Hugo bebeu e comeu ostras. Vira um patrimônio da cidade. Os bairros são preservados, a arquitetura, a memória. Se a cidade tiver que crescer, cresce pros lados, mas ninguem pensa em derrubar o MArrais e fazer prédios, mas aqui derrubam o Leblon, que era um bairro pacato e fazem dele Copacabana. A Modern Sound foi mantida esse tempo todo às custas do amor que o seu Pedro tinha por aquilo, mas aí nem só de amor vive o homem, né? beijo, volte sempre

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  18. Andrea, aconteceu algo parecido aqui em Portugal. Quando a Virgin de Lisboa fechou, bateu uma dor também. Em seguida, fechou a megastore da Valentim de Carvalho, pertencente à única “major” portuguesa. O poderoso grupo reduziu-se à lojinhas em shoppings, dedicadas apenas aos DVDs.
    Restou praticamente sozinha no mercado a poderosa Fnac, com sua rede espalhada pelo país, praticando preços imbatíveis. Foi bom? Não sei. A Fnac faz um bom trabalho, abre espaço inclusive para música ao vivo, o que é de louvar. Mas monopólio não costuma ser saudável.
    É bem verdade que ainda existem pequenas lojinhas de discos explorando segmentos como o jazz, música africana, eletrônica e pouco mais. Mas mesmo essas estão condenados a desaparecer, porque o consumidor acaba introjetando a idéia de que disco se compra é na Fnac.
    Mas nem tudo está perdido. O mercado livreiro resiste bravamente, apesar da super-oferta da Fnac.
    Vivemos uma época de transformação. O negócio da música sofre o impacto da pirataria, do mp3 gratuito e mesmo do download legal. Os leitores de livros ainda se aferram ao velho hábito do suporte de papel, mas até quando?

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  19. Luna said

    Linda a história , triste a notícia !

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  20. David Miguel said

    Tudo isso é muuuuiiitttooooo triste e como tudo sempre acaba, também a MS fechará suas portas. Herança da inexistência de uma direção para a cultura da cidade. Todos preocupados com o Carnaval, R’N’R e os grandes shows internacionais e aquele “fazedor” de cultura está desaparecendo. Tenho dito isso sempre há pelo menos 15 anos(desde o Caravelas): se vc abre a revista do Globo, semanal, encontrará 45 ou 50 shows anunciados nos tijolinhos. Desses 5 ou 6 são o “main stream” e o restante são militantes da música (músicos e produtores) que idealizam sózinhos suas apresentações e levam seu público um por um, como vc fez na MS. Ninguém olha para esses “fazedores”, ninguém se importa se o Tom já foi comprar discos na MF. Foi assim com o Mistura Fina e será assim sempre, não temos como impedir o avanço do tempo, a dinânica das idéias, a cabeça dos que poderiam e deveriam olhar para os que olham para os outros. Mas não vamos deixar a bola no chão, vamos nos reinventar, reinventar a mídia, a música, as idéias e o tempo. Vamos juntos porque sempre estivemos juntos e não faremos com que o fechamento da MS se transforme num funeral (desculpe o termo). Vc esteve na minha casa e viu meus filhos e os amigos tocando e cantando, é gente nova que está vindo, vamos beber dessa fonte, vamos avançar, vamos conquistar novas maneiras de compreender o “mercado” e como refazer suas idiossincracias (é assim que se escreve?). Eu te convido, a Lulu, o Alan, o Pauleira, a Elisa, o Joazinho, a Marf e todos os que quiserem, vamos fazer um mundo melhor para nossos filhos e vamos fazer filhos melhores para o mundo…ufa!!!!! foi uma golfada. Fui………………

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  21. olney said

    Puxa vida, lamentával!
    Eu tb curti muitas vezes os shows no Allegro. Frequento desde o início, quando ainda nem tinha palco.
    Um lugar como aquele não poderia acabar nunca…
    Quantos momentos maravilhosos; lá conheci muita gente, fiz amizades e tive oportunidade de dar umas “canjinhas” (na bateria).
    Só nos resta, agora, a tristeza de perder mais esse espaço onde se podia ouvir a BOA MÚSICA!

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  22. Guilherme Rael said

    Andréa,
    Não tive oportunidade de vê-la cantar na Modern Sound.
    Mas você realmente traçou um filme nessas linhas e pôde nos fazer ver – com seus olhos – essa boa história que você ajudou a construir. Amigos, fatos, momentos, o amadurecimento profissional e inevitavelmente o pessoal, enfim, os detalhes. Os detalhes são importantes.
    Há quem valorize. Há quem se identifique. Não os imediatistas, onde cada dia é só mais um dia, porém aqueles que acreditam no tempo como fator legitimizador e na importância de se construir histórias, boas histórias – como a sua – para contar.
    Em breve nos veremos, seja no Arranco, seja na Triboz, ou quiçá na nova Modern Sound!
    Saudações musicais.

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  23. guilherme, que bacana o que vc disse, é isso que acho. Os detalhes é que são importantes, são eles que fazem as histórias serem originais e inigualáveis! e as pessoas, tb, claro! até breve, um beijo

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  24. Olney, lembro de vc por lá e tenho certeza que o Triboz é um lugar pra acolher os órfãos da modern…

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  25. David, o que eu acho é que, sem modéstia, já estamos fazendo um mundo melhor, isso desde sempre, pq a gente sempre andou no caminho do bem, do bom e do melhor.

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  26. Luna, entao vamos ficar só com a parte linda 😉

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  27. Zoca said

    só com a parte linda… sempre!

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